19 maio 2010

O Feitiço de Carpinejar




Tudo que dizem por aí é verdade: Carpinejar é feiticeiro.

Na semana passada estive em São paulo fazendo um curso de crônicas com ele.
Fui lá especialmente para isso. Deixei duas filhas, um lar de pernas para o ar, uma empregada assoberbada, avós de plantão, um ex-marido sobrecarregado, dez saquinhos de lanche para escola prontos na despensa e uma leve impressão de que já ia tarde.

Há tempos tinha descoberto o sujeito. Por engano e por sorte, acabei encontrando as crônicas dele na internet e um bocado de mim em cada uma delas. Fiz minha inscrição sem ter dinheiro, ganhei de presente a passagem de ônibus, consegui hospedagem na casa da minha avó e acabei descobrindo que todo meu empenho não se devia só à suposta competência do escritor, mas ao nome do curso: Tanta Ternura. Que tipo de curso literário pode ter um nome desses?

É certo que eu andava desesperada de tanto entupimento criativo. Mas o que eu encontrei lá foi muito mais do que um feiticeiro. Encontrei um homem que tem o poder de esfregar as pessoas como quem esfrega uma lâmpada mágica e fazer surgir delas um gênio pronto para lhes conceder o mundo. Tudo é possível para Carpinejar. Sua cartilha é simples e letal. Não há nada no mundo mais poderoso do que a nossa capacidade de ser verdadeiro.

Foi a partir dali que resolvi girar a chave e destravar a porta das minhas histórias invisíveis, do quartinho escuro onde moram as lembranças de tudo aquilo que vi e fingi que não vi. Esse é um passo importante para um cronista. Entender que ela serve não só para falar do miúdo, para elevar o insignificante, mas também para confessar o inconfessável, porque é só nessa ação que mora a reação que a gente espera do leitor: que ele se identifique com o que mora nos subterrâneos de todos nós.

Fabrício ensinou para gente naquela semana que é preciso trabalhar com a dimensão das coisas. Buscar o essencial. Fugir do óbvio. Que todo sentimento tem sintoma. Que mentir é viver uma vida emprestada. E que devemos sempre pensar no avesso das coisas. Porque é lá que a gente se reconhece de verdade.

Tive insônia no ônibus na noite que voltei de São Paulo. Queria passar meu passado a limpo, escanear tudo que estava por ser dito na minha história. Carregar até o último pino toda a memória daqueles cinco dias que tinham me virado de ponta cabeça. E me revelado o caminho para um novo jeito de caminhar. Como que a gente pode sair de casa para fazer um curso de como escrever melhor e volta diplomado em audácia e coragem e pós-graduado no conceito da verdadeira liberdade?

Ninguém me tira da cabeça que o cara se liga em feitiçaria. Macumba braba feita com muita, muita ternura.

12 comentários:

  1. Carpinejar ainda vai ter muito orgulho de voce...

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  2. Penso como você. Tenho certeza de que fui amarrada por ele. :)
    Lindo texto.
    Beijo da Cínthya

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  3. Mais uma vez vc conseguiu acariciar minha alma com suas palavras.
    Agora, vc deixou um gostinho cruel de quero mais... quero conhecer o Carpinejar tambéeem!
    Faz uns 3 anos que venho descobrindo que este mundo onde vivemos tem mais feiticeiros do bem do que imaginamos...
    Beijo, Bia

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  4. ah, você sabia tudo isso aí.
    fingia que não.
    mas e aí nêga?
    agora carpinejou...

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  5. Sabe que sempre te vi assim, desse jeitinho!!!! Muiiito verdadeiro, profundo e terno, talvez a única diferença de Carpinejar seja clarear, como uma lanterna que vai lá no quarto escuro ver o que tem lá, sem medo, com coragem e bravura que você exala. Também quero conhecer esse feiticeiro, fiquei curiosíssima para ver sua magia.
    com amor Micka

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  6. Tb tenho a sensação de que vc já sabia disso tudo...é de vez em quando a gent eprecisa d eum empurrãozinho, algo como um catalizador.
    E fico por aqui, aguardando novos posts :-)
    beijo
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  7. Querida, que maravilha de texto! Quero conhecer o feiticeiro e reencontrar você. Como foi o lançamento? Você não me escreve mais, não manda notícias... Beijos em você, nas meninas e em toda a família, Ana.

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  8. Tati, gostei muito quando li esse texto, pois ele mostra que a função da Oficina foi muito semelhante para todos, que em seus Blogs descreveram como esse curso mexeu nas suas próprias estruturas de maneiras diferentes.
    Carpinejar definitivamente se tornou o responsável pela entradas de certas mulheres em meu mundo. Agora é você.
    Beijo grande.

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  9. Lindo. - era uma coisa que eu estava com pudor de admitir, que talvez carpinejar tenha sido crucial na minha vida.
    o curioso é que nunca tinha ouvido falar dele, lido nada escrito por ele, e resolvi fazer o curso por um motivo um pouco como o seu.
    tanta ternura. - o nome me conquistou. me puxou pelos cabelos e eu não pude dizer não.
    deve ser macumba, sem dúvida alguma.
    um beijo,
    nina.

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  10. Oi querida... nao sei quem é esse cara... mas se voce diz que é mágico, ja gostei... se lhe ajudou... ja o amei!!!
    Apesar de areas tao distintas quanto as nossas, (economia x artes)cada vez mais me convenço de que a sua é melhor do que a minha!!! acho que voltarei a escola, mas em cursos para alimentar minha alma...
    saudades... mande noticias... tenho mandado e mails e voce nao responde!!! beijossss Galega de Joinville...

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  11. OLHA O São Jorge!!!!
    Beth

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  12. Fabrício ensinou para gente naquela semana que é preciso trabalhar com a dimensão das coisas. Buscar o essencial. Fugir do óbvio. Que todo sentimento tem sintoma. Que mentir é viver uma vida emprestada. E que devemos sempre pensar no avesso das coisas. Porque é lá que a gente se reconhece de verdade.

    Eu sempre achei que a gente deve ser autêntico, apesar de tudo e de todos. Ser diferente às vezes dói mas é melhor do que a outra opção. Na dúvida, prefiro ser eu mesma!

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