16 março 2012

Insensatez Existencial



Eu tenho muito, muito medo de ficar louca.

Minha mãe costuma dizer que as pessoas que tem medo de enlouquecer são as que seguramente não ficarão. Eu duvido um pouco. Não acho minha mãe uma pessoa muito normal.

Não que isso seja uma coisa ruim. Muito pelo contrário. A loucura me soa como uma liberdade estarrecedora. Uma contravenção permissiva e heroica na qual se pode tudo, sem limites. E é aí que mora o perigo. Entre a estabilidade da sanidade e a curiosidade do desvario há uma linha muito tênue que pode romper-se a qualquer passo desequilibrado.

O medo da loucura sempre me traz uma sensação estranha de que, a qualquer momento, posso ultrapassar essa linha e não conseguir voltar mais. É um medo bonito. Um medo quase poético de constatar a insensatez da vida.

Outro dia soube de um conhecido que se matou. As notícias de suicídio sempre me deixam perplexa. É preciso muita coragem para tomar essa decisão de interromper a vida. E o que me abate profundamente é imaginar o sofrimento que essa pessoa deveria estar passando. Acho muito compreensível que alguém um dia, simplesmente não consiga mais dar conta da vida.

Eu vivo um conflito diário para tentar dar conta da minha. De verdade. Estou sempre em luta comigo mesma para não sucumbir. Viver antigamente parecia mais fácil. Mas hoje, com tanta informação sobre os acontecimentos do planeta, a sensação que me dá é que tanta injustiça, tanta dor, tanta miséria, tanta desigualdade, tanta crueldade, tanta sombra... não vai caber dentro de mim. Minha terapeuta está sempre tentando me acalmar. Dizendo que a vida é essa eterna dualidade mesmo. Que há sombra, mas também há luz. Que há noite, mas também há o dia para tentarmos sempre, equilibrarmos esse fantástico sistema onde vivemos.

Bom, eu me recuso a viver uma vida medíocre.  Mesmo que tenha que pagar um preço altíssimo por isso. Mesmo padecendo mais do que aqueles que ignoram, mesmo tendo que sofrer preconceitos por jamais me acostumar à grandiosidade e magnificência da vida, ainda assim, eu prefiro estar fora do padrão. E ser chamada de doida muitas vezes por aí.

Estar vivo é um milagre. Como é que eu posso achar as coisas normais? Como é que querem me convencer de que vivemos todos, uma única realidade? O que é realidade? Aquilo que é relativo a concreto? Mas com que concretude se pode afirmar o que é e o que não é verdadeiro? A verdade é tão relativa. Nada tem muito explicação ou coerência. Cá entre nós minha gente, o buraco dessa vida é bem mais embaixo e é justamente isso que me apavora.

Que nunca nada nem ninguém me faça perder o espanto. Mesmo com toda a contradição da vida, seguir a vida bordando doidice ainda é a melhor escolha. Mesmo com todo medo que eu tenho da loucura.

Antes pinel do que múmia paralítica.

20 comentários:

  1. Antes assim minha linda... Muito mais melhor de bom fora dos padrões! Parabens mais uma vez. Mil beijos, cheios de amor e saudades. Beijocas nas princesas

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    1. Que a nossa loucura pelo menos gere bons frutos, não é minha querida. Saudade! Beijos

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  2. Amei Tati, li, reli .....Vc tem toda razão!! AMO VC!!

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    1. Puxa, se eu soubesse quem é você, também teria certeza que te amo. : )

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  3. Caramba, hoje tua veia filosófica estava atiçada! Mas, muitas vezes eu também me sinto assim: como é possível, hoje, com família, filhos, poder ter uma vida "normal"? Há tanta dor e desespero lá fora, tão perto da gente, que a gente acaba ficando preso internamente na gente. Mas fazer o quê? "É preciso saber viver"

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    1. Rafa, como é bom te ter aqui por perto, amigo. É isso. A vida não pode ser normal com tudo que há, mas ela fica bem mais leve com esse bocado de amigos queridos que tenho. Gosto muito de você! Beijo!

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  4. Eu preciso comentar a imagem magnífica que colocou como ilustração dessa loucura tão sadia que você vive. Essa imagem é o retrato perfeito do sentido de liberdade que nos assola. O que nos leva a voar são os pássaros livres (planos, amores, medos, idiossincrasias, etc e tal) e não o lindo pássaro preso na bela gaiola. Continuo na opinião de que você não vai ficar louca (aliás, o que isso é, exatamente?) porque você já É uma louca adorável, linda, solta no ar. O que leva ao Pinel são patologias e este não é o seu caso. Dor de viver? Excesso de sentir? Isso é coisa de doido que sabe que a vida exige muito de quem não tem medo de viver. E agora, hein, onde fica seu medo? Com todo amor da sua doida-mãe!

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  5. Ia esquecendo de fazer uma advertência: cuidado com o passaro da gaiola - ele é perigoso e pode ser traiçoeiro - queria estar fora quando está preso dentro. Isso sem falar no peso da gaiola...
    Da sua doida-mãe que já alçou vôo e enlouquece todo dia um pouco mais.

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  6. Mulher de Deus, alguém tem que descobrir a sua loucura e te lançar pelo mundo, voce é um poço de inspiração, seus textos são deliciosos, mesmo quando possuem um "q" de loucura...mil beijos

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  7. Adorei, Tati! E quem é que não se sentiu louca algum dia? :-)

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  8. "O insensato que reconhece sua insensatez é um sábio. Mas um insensato que se crê sábio é, em verdade, um insensato." (Buda)

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  9. Sinônimos de insensatez: aluamento ("estar no mundo da lua"), disparate, desorientação

    Mulheres são seres misteriosos, não?! Quando regidas pela Lua, mergulham em suas marés emocionais e perdem sua orientação, ao navegar em mares escuros... Nada que o brilho do Sol não resolva, quando se levanta pelas manhãs!

    Bjs em seu (por vezes) insensato coração, minha amada.
    Beth

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    1. Beth Bear! Que bom saber que existe alguém no mundo que por vezes, me resgata dos oceanos profundos e escuros. Você é um pouco o meu Sol, minha querida...

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  10. E pensando um pouco mais, ainda bem que a Lua conduz os navegantes "insensatos" por esses mares escuros: beber das águas desse grande útero da vida, fluir com as marés, contornar os obstáculos, descobrir novas terras fecundas, resgatar os tesouros escondidos... Tanto a descobrir... Mas para isso é preciso navegar. Por isso, abaixo a "normose" e viva "estar fora do padrão"! Ao contrário do que parece, este é um sinal de grande sanidade.
    Bendito insensato coração, minha querida.
    Mais beijos,
    Beth
    PS: e não esqueça, o Sol se levanta todas as manhãs!

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